quinta-feira, 5 de abril de 2012

Amanhã

Temos uma enorme apreciação pelas primeiras coisas. Na verdade, o primeiro sempre acaba se tornando referência para o segundo, o terceiro, o quarto e para os sem número acontecimentos frente aos quais nos deparamos em ordem sucessiva na vida. Nada é mais emocionante do que o primeiro dia na escola, o primeiro beijo, o primeiro salário, o primeiro carro, os primeiros passos de um filho.

Entretanto, inversamente proporcional à emoção do primeiro, está a agonia do último. Temos arrepios quando pensamos na hipótese das últimas coisas, justamente porque elas nos remetem à proximidade do fim. Pensar no fim da linha é uma coisa mórbida, desconfortável, e praticamente proibida, mas que necessariamente nos faz refletir.

Duvido que alguém nunca tenha ouvido ecoar a famosa pergunta: “O que você faria se soubesse que amanhã será o seu último dia?”. Felizmente, respondemos a pergunta tratando-a como hipótese não confirmada, já que temos a graça de não conhecer o que de nós será contado. Mas, e se soubéssemos realmente? E se o fim fosse amanhã, na próxima semana, mês ou ano? O que faríamos diferente?

As respostas normalmente são as mais esdrúxulas possíveis. É como se tivéssemos a oportunidade de nos tornarmos outra pessoa, completamente oposta a quem somos verdadeiramente no íntimo. Nessa hipótese, o mais conservador dos homens torna-se destemido, e a rotina passa a ser o mais sufocante de todos os monstros. Tudo o que nunca foi realizado passa a ser prioritário: pular de pára-quedas, viajar ao outro lado do mundo, nadar com os golfinhos, conhecer um safári, comer um prato inusitado, satisfazer todas as perguntas não respondidas, buscar explicação para todos os “serás?”, quebrar os tabus, fazer aquela loucura que sempre inspirou curiosidade, e dizer o que nunca foi dito, para quem nunca foi dito, em termos que nunca foram ditos...

Na verdade, essa caixinha de desejos nada faz além de mostrar uma fragilidade enorme do ser humano: a de ser incompleto. O homem quer conhecer todos os gostos, todas as sensações, todas as faces da vida, justamente para preencher todos os vácuos que tem dentro de si. E por isso, busca incessantemente pela tão preciosa PLENITUDE.

Mas ele esquece que, ao buscar a plenitude, está lutando contra a sua própria natureza mortal. A onisciência, ou seja, o saber todas as coisas, não é um atributo que o homem possui, nem nunca possuirá. Já dizia o velho filósofo que “quanto mais sabemos, mais sabemos que nada sabemos”. E menos sabemos porque entendemos que a perspectiva das coisas é muito maior do que aquela que conseguimos perceber, simplesmente porque é infinita, ou plena, completa. E nós, na total contraposição da plenitude, somos incompletos e imperfeitos.

Infelizmente, as notícias não são animadoras: nada que o mundo possa oferecer pode completar essa lacuna do coração humano. Absolutamente nada. Nem aventuras, nem novas sensações.

Entretanto, a boa notícia é que esse espaço vazio pode ser ocupado pela PLENITUDE DIVINA. Isso acontece quando sabemos que somos cuidados por Deus, e temos a certeza de que Ele olha por nós. Dessa forma, aprendemos a ver a plenitude nas pequenas coisas, que Ele nos permite fazer ao lado das pessoas que amamos.

Não estou dizendo que devemos desistir dos sonhos malucos que guardamos no coração. Mas a primeira coisa a fazer é saber se realmente essas coisas malucas fazem parte do nosso “eu”. Por que muitas vezes queremos coisas que não têm absolutamente nada a ver com a nossa personalidade?
Precisamos nos convencer de que a plenitude verdadeira faz par perfeito com os nossos traços, características e sentimentos, já que os verdadeiros sonhos não podem negar as nossas convicções, ou anular nossos princípios. Antes, eles devem incentivá-los e reforçá-los de forma segura e harmoniosa.
Além do mais, por que esperar até o fim para realizá-los? Eles devem ser perseguidos em todo momento, e não somente quando se conhece a proximidade do fim. Afinal, seria um grande erro encarar os “últimos desejos” como um remédio que tardou a chegar, ou um mero escapamento para aliviar as insuportáveis pressões vividas até então.

A plenitude mora no nosso próprio coração, e depende de nós deixar com que ela se aflore. A plenitude, ou a falta dela, depende inteiramente da forma com que coisas são encaradas, e está relacionada à maneira com que lidamos com as situações. Seremos completos quando soubermos que temos a vida que Deus nos deu, da forma que ela é, nua e crua, com as condições que temos, nos moldes simples em que vivemos. Nada mais, nada menos. Por isso, a rotina não deve ser um monstro sufocante, mas a maior das graças divinas.

Se alguém perguntar: “O que você faria se soubesse que amanhã será o seu último dia?”, eu provavelmente responderia que faria as coisas exatamente da mesma forma que sempre fiz, pois estou segura de quem sou, e sei em Quem deposito minha confiança. E conjecturas à parte, Ele sim é o Senhor do Amanhã.

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