quinta-feira, 5 de abril de 2012

O modus operandi das coisas

Como somos animais racionais, estamos acostumados a pensar os fatos da vida de forma lógica, e temos a tendência de abrigar nossas premissas e convicções sob o “guarda-chuva da razão”. Buscamos sempre explicações matematicamente corretas e cientificamente prováveis. Defendemos correlações precisas de causa e consequência. Fundamos nosso raciocínio em fatos, observando o passado e fazendo projeções, que mais parecem palpites, sobre o que o futuro trará.

Na verdade, nosso cérebro foi TREINADO para entender e processar os acontecimentos de forma que nos seja sempre possível prever o que vai acontecer, como se isso fosse nos livrar de qualquer imprevisto.
Por exemplo, se está trovejando, já processamos internamente a informação lógica que indica a chegada da chuva. Preparamos nossa capa de chuva, desligamos os equipamentos elétricos de forma a evitar que qualquer acidente ocorra. Se pensarmos diferentemente, é porque tem alguma coisa errada. Na verdade, tudo aquilo que foge da lógica racional soa estranho, incoerente, insensato.

Na maioria das vezes, nossa forma de encarar a seqüência dos fatos da vida - o modus operandi das coisas - se encaixa perfeitamente nessa lógica racional. Aconteceu isso, posso esperar aquilo. Fiz assim, vou receber assado. Cometi um erro no trabalho, vou ser despedida pelo chefe. Fui acometida por uma doença, vou procurar tratamento. Nasci numa família pobre, nunca vou conseguir um emprego interessante. Tenho muito dinheiro, não vou precisar da ajuda de ninguém. Esse é o corolário inquestionável dos fatos.
Aaah, ledo engano! Se a vida pudesse ser calculada com fórmulas exatas, tudo seria muito mais fácil. Mas, todos sabem, as coisas não funcionam dessa forma. Alguns elementos sobrenaturais nos circundam, e por vezes, mudam totalmente nosso rumo.

Estava estudando a história do grande rei Davi, e tirei uma lição muito importante para a minha vida. Em sua infância, o pequeno Davi não passava de um mero pastorzinho de ovelhas. O trabalho dele era cuidar de cada um de seus animais, evitando que se perdessem ou machucassem. Nada de muito complicado. Ele era um anônimo, conhecido de ninguém, e esquecido até pelo próprio pai, que tardou em lembrar-se dele.

Apesar dos pesares, o que aconteceu com Davi? De fato, a “lógica” da vida dele não apontava para um grande futuro. Quem olhasse para a bússola do pequeno Davi, certamente não veria a seta marcando “Norte”. Quem o visse, não diria que seu destino seria repleto de glórias e honras, e que se tornaria rei de toda uma nação. Mas, foi exatamente isso que aconteceu: para a surpresa de todos, ele tornou-se um grande rei.

E, por mais estranho que possa parecer, isso não aconteceu por decreto, de maneira automática. Não! Pelo contrário, as coisas foram acontecendo aos poucos. Deus foi abrindo os caminhos daquele pastorzinho de maneira gradual. Quando entrou no reino de Saul, seu predecessor, não foi vestido com roupas reais. Entrou na condição de músico, cantando e tocando seu instrumento humildemente. Demorou até que Davi finalmente se tornasse rei...

Na vida, as coisas não são lógicas, nem automáticas. Eu acredito que a lógica da vida funciona muito mais na base das “casualidades” ou “coincidências” - para quem assim classificar esses fenômenos incomuns - do que na base das certezas humanas. Eu prefiro chamá-los de “mão divina”.

Se formos analisar a história de Davi, ele apenas conheceu o rei Saul por causa de um elemento totalmente inesperado: a música. A seqüência de títulos “Pastor de Ovelhas”, para “Músico”, e em seguida “Rei”, não me parece seguir qualquer tipo de lógica de crescimento profissional. Não acho que Davi tenha cadastrado seu currículo num banco de dados da Internet, ou se aconselhado com um consultor especializado em Recursos Humanos. Davi também não foi obrigado a participar de um processo seletivo concorridíssimo, como são os das empresas multinacionais ou das faculdades de prestígio, para obter reconhecimento de sua qualificação. Não! Deus simplesmente moveu as pecinhas, de forma bastante branda, até que a obra na vida daquele João-ninguém se concretizou.

A grande lição que tiro dessa história é que as grandes mudanças da vida não são fruto de “grandes transformações”. Não são grandes experiências, grandes viagens, grandes oportunidades de emprego, novos relacionamentos, que realmente mudam a nossa vida. Não que coisas desse tipo não sejam importantes; sim, são. Mas essa não é a regra, e sim a exceção.

A GRANDE mudança acontece no coração, nos hábitos, nas atitudes, no dia-a-dia, no corriqueiro, e, sobretudo, no longo prazo. Ela é fruto de uma vida com Deus. Uma vez vivendo na dependência dEle, as outras mudanças da vida acontecem nas pequenas curvas, nos detalhes, nas minúcias. A gente nem dá valor e nem percebe que elas estão se realizando aos poucos. A gente só percebe depois de muito tempo, quando olhamos para trás.

Isso virou premissa na minha vida: grandes oportunidades aparecem em uma conversa informal, em um comentário, em algo aparentemente sem importância. A gente descobre coisas importantes falando com aquele amigo de todos os dias, com aquele vizinho meio chato, com o comerciante da esquina. É normalmente por aí que Deus move os seus palitinhos. Deus abre os caminhos sem que a gente perceba. Foi assim que aconteceu com Davi e é assim que acontece também na nossa vida.

Por isso, é importante parar de ficar esperando por grandes mudanças matematicamente calculadas, ou apostando todas as fichas numa loteria que nunca será ganha. Loterias são miragens, e miragens não devem fazer parte da nossa vida. Para buscar mudanças e oportunidades, é mais fácil viver o hoje como fazem os japoneses, no passo a passo, no “kaizen”, que é a melhoria contínua. Isso significa que podemos nos aperfeiçoar com pequenas ações. Assim como nos ensina Davi, pequenas ações todos os dias nos levam a mudar o rumo de nossa história, e quando olharmos para trás... quem diria, hein? Derrotamos gigantes.

Tenho certeza que Davi, na sua infância, jamais imaginaria que se tornaria rei. Na sua velhice, ele deve ter olhado para trás, e visto o quão importante foram as curvas, os tropeços, os detalhes e o dia-a-dia da longa trajetória que o consagrou!

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